APRENDIZ DE JORNALISTA
JORNAL ON LINE LABORATÓRIO UFRN JULHO 2003


PROGRAMAS POPULARES: UTILIDADE PÚBLICA OU BAIXARIA?

         Diante dessa dúvida, cabe aqui outra questão: os programas são populares porque são de utilidade pública ou são de utilidade pública porque são populares? Até onde vai a bondade de seus apresentadores? Independente das respostas, o fato é que os programas populares no Rio Grande do Norte, a cada dia que passa, conseguem se firmar como atração indispensável na hora do almoço.

        De segunda à sexta, das 11h às 14h30m, o telespectador potiguar, principalmente aquele residente na capital, assiste a uma programação composta por telejornais, programas policiais e de variedades. A TV Potengi, a TV Tropical e a Ponta Negra são as responsáveis pela transmissão, respectivamente, do Linha Dura, Caso de Polícia e Patrulha Policial. Programas populares considerados de utilidade pública pela maioria dos telespectadores porque assumem diversas vezes o papel do Estado, prestando serviços assistencialistas.

         Taxados como sendo de baixaria, os apresentadores desses programas se defendem: “Uma coisa é você ser popular que é o que eu faço em todos os lugares por onde passei e hoje com mais cuidado exatamente para evitar esse tipo de comentário. Outra coisa é baixar o nível”, explica Salatiel de Souza, apresentador do Caso de Polícia. “Eu acho que baixaria é quando você agride a pessoa. Eu faço uma coisa descontraída, que o povo entende. Eu preservo a pessoa, eu faço a crítica ao político, ao trabalho”, diz Luiz Almir, apresentador do Linha Dura.

         Em contrapartida, para fiscalizar se há ou não baixaria nesses programas, foi instaurada no estado uma Comissão de Ética baseada no programa “Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania”. Composta por representantes oriundos de diversos segmentos da sociedade e vinculada à Comissão dos Direitos Humanos – RN, esse grupo monitora, avalia e adverte os programas e as emissoras.

        Segundo a professora e doutora do curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Graça Pinto, feita a análise e constatado que o programa analisado ultrapassou os limites, ou seja, que ele levanta questões que são contra a cidadania, a emissora responsável pelo programa é notificada até duas vezes para modificar essa estrutura. Caso as providências não sejam tomadas, a comissão denuncia publicamente os anunciantes que estão sustentando aquele programa.

         Fazendo o estilo rádio-TV, onde o apresentador conversa com o ouvinte de uma forma descontraída e improvisada, esses programas conseguem abordar temas que variam entre brigas de vizinhos e denúncias contra o governo. “Eu chego aqui (TV Tropical) e vou acompanhar as matérias. Prefiro até não ver antes para ter a mesma reação da pessoa que está em casa”, explica Salatiel. O que cativa ainda mais o telespectador é a forma como os apresentadores usam a linguagem coloquial, artifício muitas vezes criticado pelos mesmos. O principal alvo dessa crítica é o apresentador do Linha Dura que chega a utilizar em seu programa palavras de baixo calão. “Eu tenho que dizer um linguajar que todos entendam”, defende-se.

O ASSISTENCIALISMO NA TV

        Não é de se estranhar que numa imprensa de conhecida tradição política como a potiguar, constantemente utilizada para promoção dos seus candidatos, tenhamos alguns programas com práticas assistencialistas como a distribuição de cestas básicas, remédios, cadeiras de rodas, além de denúncias que cobram das autoridades melhores serviços. Os programas populares transmitidos pela TV potiguar, muitas vezes, prestam serviços que são de competência dos governantes, e por isso são considerados de utilidade pública, o que talvez justifique os elevados índices de audiência. 

        Apesar de acusados de promover a baixaria na TV, esses programas, indubitavelmente, prestam um serviço à população, principalmente às classes C, D e E, as quais estão direcionados. Esse fato é comprovado inclusive pela Comissão de Ética-RN: “Diante da ausência do Estado, esses programas aproveitam para atuar. Para ter seus direitos mantidos, a população apela para a televisão”, avalia Graça Pinto.

        Perguntados o porquê dos seus programas serem de utilidade pública, os apresentadores se explicam: “Nós discutimos todos os problemas que a imprensa discute, os assuntos mais importantes a gente discute. Aí eu dou a minha opinião, às vezes acertando ou errando. E o telespectador julga. É um programa de utilidade pública porque é informativo. Aqui damos no mínimo 10 sacolões por dia. Nós doamos aqui carro de mão, carro de cachorro-quente, cadeiras de rodas em média de 8 a 10 por mês. Então ele é público e prestador de serviço.”, diz Luiz Almir, que além de apresentador de TV é deputado estadual. Já Salatiel de Souza é mais genérico e avalia: “Nosso papel de imprensa tem essa responsabilidade e essa finalidade: prestar serviço. Nosso programa é de utilidade pública, na hora em que a gente denuncia e consegue colocar a autoridade e a comunidade, e partindo daí, do nosso programa, conseguir a solução”.

        A participação do público é atestada diariamente pela produção dos programas. De acordo com Roberta Trindade, diretora do Linha Dura, quando há transmissão de matérias cujo foco são as mazelas da sociedade, a emissora recebe vários telefonemas de pessoas solidárias a situação exposta. Todas querendo doar algo para ajudar os necessitados.     

A ATUAÇÃO DA COMISSÃO

        Nacionalmente, o projeto Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania, já conseguiu colher alguns frutos. Alguns quadros de programas como Domingo Legal e Domingão do Faustão já foram modificados devido a atuação da Comissão de Ética nacional. No Rio Grande do Norte – único estado que possui uma comissão regional – a atuação da comissão ainda é tímida. Praticamente nada foi feito.
         Mas trabalho é o que não falta. A comissão terá que avaliar os programas e ponderar o que deve ou não ir ao ar. Pelo menos um fato concreto existe: os apresentadores Salatiel de Souza e Luiz Almir, promoveram há poucas semanas uma discussão que resultou num processo criminal movido pelo primeiro contra o segundo. Já na TV Ponta Negra o telespectador pode assistir diariamente cenas e relatos de crimes, homicídios entre outros. Outro fato que merece ser apurado é a acusação feita por Luiz Almir de que há um apresentador que recebe um salário de R$ 2.500,00 pago pela Prefeitura do Natal, para que o mesmo faça propaganda negativa dele.

         Embalados por uma onda que começou nos anos 90 com o polêmico Carlos Massa, o Ratinho, os programas populares, tanto em nível local como nacional, consomem uma enorme fatia do bolo da audiência. Criticados, amados e odiados, seus apresentadores assumem responsabilidades cabíveis ao Estado. Fazendo isso, eles conseguem um local de destaque na imprensa e na sociedade. Ignorá-los é impossível, fazer com que suas atuações sejam as mais discretas e benéficas possíveis é uma tarefa de todos.

 


Carla Jeane de França Ribeiro, Roberto Wagner C. de Lucena, Sara Jane Freitas de Vasconcelos e Séphora Silva da Rocha