ENTRE A CRUZ E A ESPADA
Glidson, Edwin,
Ricardo Fagundes, Erick Olimpo
O
curso de Comunicação Social da UFRN vive um período conturbado. Além de
ter sido reprovado na avaliação do MEC, o curso (com única habilitação em
jornalismo) tem até o final do mês
de junho para concluir e enviar um projeto acadêmico para a comissão
avaliadora do MEC. Caso contrário, corre o risco de ser descredenciado pelo
Ministério da Educação.
Fundado
em 10 de maio de 1969 pelo então governador Aluízio Alves, a Faculdade de
jornalismo Eloy de Souza foi incorporada à UFRN em 1973, sendo o primeiro
curso de jornalismo a ser implantado no Nordeste. Hoje, ironicamente, sofre o
sério risco de ser o primeiro curso de jornalismo do Nordeste a ser fechado.
Um curso que serviu de referência para várias universidades
nordestinas, agora luta contra deficiências gerais – desde a falta de um
projeto pedagógico até a infra-estrutura precária – que só agravam o
estado do curso em relação à avaliação do MEC.
Na
avaliação feita pelo Ministério da Educação, jornalismo da UFRN foi
reprovado nos três critérios adotados: qualificação do corpo docente,
organização didático-pedagógica e instalações gerais. Além disso, no
Provão, que é feito para avaliar o rendimento dos alunos concluintes dos
cursos de graduação, o curso não vem obtendo bons resultados, o que
contribui negativamente para uma mudança na atual situação em que se
encontra. Para os responsáveis pelo curso, o momento é o de procurar
resolver os problemas que faltam para concluir o projeto acadêmico e enviá-lo
ao MEC, já que o prazo está expirando e ainda existem várias pendências a
serem solucionadas.
No
que diz respeito à qualificação dos professores, o MEC foi taxativo: o
curso precisa urgentemente qualificar seu quadro de docentes. Atualmente, dos
22 que fazem parte do DECOM (departamento de comunicação) apenas 7 tem
mestrado. Na visão do Reitor da UFRN, o Prof. Ótom Anselmo, o MEC confunde
qualificação com titulação. “Acho que o maior pecado nos critérios
utilizados pelo MEC é no que diz respeito à qualificação dos professores,
porque associa a qualificação só à titulação. Na nossa universidade por
exemplo, temos bons profissionais na área de comunicação, atuantes no
mercado jornalístico, mas não temos professores bastante titulados, então
tivemos uma avaliação negativa nesse ponto em função do critério avaliado
pelo MEC”, afirmou o reitor.
Para
resolver o problema da titulação de professores, a UFRN está planejando um
curso de pós-graduação inter-institucional, e para isso está contando com
a ajuda da ECA, Escola de Comunicação e Artes da USP – Universidade de São
Paulo, visando implantar o projeto de mestrado a partir do próximo semestre.
O segundo item
criticado pelo MEC, o projeto pedagógico, está sendo elaborado por uma
comissão composta por alguns professores do curso. O projeto engloba várias
mudanças, inclusive na grade curricular, que será alterada e adicionada de
novas disciplinas, além de uma segunda habilitação - em radialismo -
voltada para a criação, produção e direção dos produtos
audio-visuais. A intenção é introduzir disciplinas de cunho técnico já a
partir do primeiro semestre, tentando dessa maneira, dissociar a barreira
existente hoje entre teoria (aplicada nos primeiros semestres) e técnica
jornalística (prática). O curso
não possui estrutura própria, utilizando as salas de aula do setor V da
universidade, pertencente ao CCSA (Centro de Ciências Sociais Aplicadas), os
laboratórios se encontram em situação precária e os meios de comunicação
da UFRN (TV, gráfica, editora) não fazem parte do Departamento de Comunicação,
o que dificulta seu acesso ou utilização voltada para o aprendizado do
aluno. Para superar essa grande dificuldade
está sendo elaborado um projeto de infra-estrutura, pelo professor Maurício
Pandolphi, onde um novo prédio
deverá ser construído, comportando salas de aula e laboratórios para
oficinas e produção jornalística dos alunos.
Apesar das providências
que estão sendo tomadas para a melhoria do curso, existem vários problemas
que adiam e complicam a finalização do projeto acadêmico, que precisa ser
entregue ao MEC no prazo delimitado. O projeto, que foi encabeçado por uma
comissão, está sofrendo alterações feitas por alguns professores que
discordaram em alguns pontos da forma como foi elaborado, principalmente na
questão da reformulação da grade curricular, com a eliminação de algumas
disciplinas e a introdução de novas, o que, segundo os professores
discordantes, tem que ser pensado de uma forma mais adequada, procurando
situar a grade à realidade do curso e às necessidades evidentes do mercado.
No tocante à qualificação do corpo docente, o curso também enfrenta
barreiras para completar o quadro mínimo de professores aptos para iniciarem
o curso de pós-graduação, que é uma exigência do MEC. O DECOM está
tentando contactar professores de outros cursos para integrar o grupo de que
irá fazer a pós-graduação, pois sem o número determinado pelo Ministério
da Educação, a qualificação não acontecerá.
O professor Maurício
Pandolphi, da disciplina de radiojornalismo, foi o responsável pelo projeto
de infra-estrutura, que irá delimitar a construção das possíveis novas
instalações do curso, além da compra dos materiais necessários para os
laboratórios. De acordo com Maurício, já existe uma verba destinada para a
construção do novo prédio e aquisição de novos computadores e
equipamentos técnicos em geral. O que foi constatado até então, é que
nenhum equipamento novo foi visto nos laboratórios. Os computadores que foram
anunciados como prioridade para o curso ainda não chegaram e os que existem,
na sua maioria, não dispõem dos programas necessários para o
desenvolvimento de produção jornalística. O projeto de infra-estrutura física
e aquisição de equipamentos já estava terminado, mas agora está sendo
alterado por outros professores que novamente não concordaram com a proposta
do professor Maurício. Todas essas mudanças no projeto acadêmico estão
atrasando cada vez mais a sua conclusão e promovendo o corre-corre dos
professores do Curso e dos coordenadores do Departamento de Comunicação
Social, para a entrega do projeto ao MEC.
Todas
as discussões em torno das mudanças e expectativas do curso em relação ao
seu futuro acontecem no âmbito das plenárias. Atualmente, elas estão
acontecendo com uma freqüência alucinante, por causa do prazo do MEC, que
encurta a cada dia. Os alunos, principais interessados da situação, estão
sempre presentes nas plenárias e participam, dando sugestões e cobrando soluções
coerentes para melhorar a imagem do curso perante à sociedade. Segundo os
estudantes, praticamente todos os dias saem estampadas nos jornais e na
televisão, matérias a respeito da situação do curso. Todas abordando
apenas os aspectos negativos que ele apresenta, o que vem gerando um
constrangimento geral por parte dos que o fazem, que são alvo de piadas de
mau-gosto por parte de amigos e das pessoas que lêem as matérias, do tipo
“quando é que o curso fecha mesmo, hein?”. Alguns alunos apontam a
reitoria da universidade e os professores e coordenadores como os principais
responsáveis pela situação atual, uma vez que, de acordo com os estudantes,
a universidade e os professores do curso nunca se organizaram para promover
mudanças efetivas que viessem a evitar o momento atual de dúvidas e apreensão,
e reclamam que só quando a coisa está crítica é que alguém resolve fazer
algo, mesmo assim com muita demora e confusão. É o que aconteceu nas últimas
plenárias: o projeto foi apresentado aos professores, que na sua maioria, não
tinham participado da formulação, ficando leigos quanto ao conteúdo, e
agora, que estão a par dele, querem fazer mudanças de última hora, adiando
ainda mais a data de entrega do Projeto, que ainda têm que passar pela Pró-reitoria
da UFRN, para depois ser encaminhado ao MEC. O motivo da ausência da maioria
dos professores na elaboração do projeto não se sabe. “A melhor solução
para a finalização do Projeto talvez fosse a total participação dos
professores na sua construção , para que fossem evitadas as controvérsias e
discordâncias”, defendem os alunos de jornalismo.
No
último dia 11, foi realizado em todo o Brasil,
o Exame Nacional de Cursos, o “Provão”, que visa avaliar o
rendimento dos estudantes concluintes da graduação. A posição tomada pelos
alunos do curso de jornalismo da UFRN foi a de boicotar o Exame, contestando
os critérios utilizados pelo MEC. O resultado do boicote foi a adesão de 54%
dos estudantes, número superior ao esperado pelo CA (Centro Acadêmico do
curso de Comunicação). “O CA fez três seminários desde o início do ano,
tentando conscientizar os estudantes sobre a importância do boicote”,
comenta Evânio Mafra, presidente do Centro Acadêmico. “Nós somos contra o
Provão porque ele não tem o objetivo de melhorar o ensino superior no
Brasil, e sim, de “ranquear” as instituições e cursos”, completa
Mafra. O presidente do CA afirma
que o que os estudantes querem é que o Governo diga o qual o modelo de
universidade ideal para que se possa chegar lá, e não que apenas
as “ranqueie”.
O
boicote não foi visto com bons olhos pelo DECOM, que achou infeliz a posição
dos alunos que não fizeram as provas do Exame. Indagado sobre as consequências
negativas que o boicote poderá surtir para o curso na atual situação em que
se encontra, o presidente do CA falou que o Provão em si não tem muita
validade. “na verdade, o Governo joga com uma arma muito poderosa que é a mídia,
o Provão não têm validade nenhuma porque não existe uma lei que determine
que você vá fechar uma universidade porque ela tirou “D” ou “E” na
avaliação do MEC”, conclui Mafra. A verdade é que a repercussão que o
boicote vai ter só será conhecida nas próximas semanas, talvez pela própria
“mídia”, citada por Evânio. Além do curso da UFRN, praticamente todos
os demais de comunicação das universidades públicas do país aderiram ao
boicote.
O momento agora é de apreensão e incertezas: o Departamento de Comunicação corre desesperadamente para concluir o Projeto Acadêmico, a fim de entregá-lo à Pró-reitoria, que o encaminhará ao MEC, para ser avaliado e receber o veredito final: passa ou não passa. Este é o “vestibular”” do curso de jornalismo da UFRN. Tanto ele , como todos os outros cursos de comunicação do país que receberam o conceito de insuficiente pelo MEC vão ter que passar por esta prova de fogo, e sair ilesos. Caso contrário, o futuro dos alunos de comunicação estará prestes a ser tenebroso, e talvez nem venha a acontecer, caso o MEC resolva fechar os cursos reprovados. O que se espera é que, se o curso sobreviver a esta linha de fogo, não se venha a cometer os mesmos erros do passado, que fizeram com que chegasse a essa situação tão difícil e desagradável, principalmente para os estudantes, que lutaram com muita dificuldade para adquirir o direito de cursar uma universidade pública, e que não podem ser vitimados injustamente dessa forma, pagando o pato. Se o curso for descredenciado pelo MEC, para onde irão? A avaliação do MEC pode até ter seus critérios contestáveis e seu caráter posto em dúvida, mas, pelo menos serviu para apontar problemas que sempre existiram e que precisam ser solucionados. Espera-se que o curso de Comunicação Social da UFRN possa recuperar o prestígio que hoje já não tem. E para isso é necessário que todos se unam, deixando suas ideologias e realizações pessoais em prol da construção de uma nova realidade para o curso: crítica, moderna e estimulante.