A CHAVE DO APOCALIPSE
Jan Val Ellam
O
que aqui será exposto deverá servir apenas como parâmetro para reflexão,
jamais como verdade estabelecida, até porque o assunto enfocado eleva-se
muito acima do que normalmente o atual nível da condição humana pode
entender. Afinal, compreender o roteiro dos fatos proféticos constantes no
livro do Apocalipse, a partir dos acontecimentos ocorridos no dia 11 de
setembro de 2001, é tarefa que requer cuidadosa reflexão. Mais complexa
torna-se ainda a questão pelo fato de estarmos vivendo um momento planetário
em que diversos conflitos estão ocorrendo, e sabemos todos que a primeira vítima
das guerras é sempre a verdade, já que os interesses antagônicos das
partes em questão procuram revestir os fatos com as cores de suas conveniências.
Mas não nos furtaremos a ofertar o que nos foi revelado, mesmo que sejamos
os primeiros a ressaltar a nossa pequenez para tanto, ao mesmo tempo em que
reconhecemos que o presente estudo requer o devido aprofundamento, o que, a
seu turno, possivelmente será feito.
Assim,
as profecias constantes no Livro da Revelação — O Apocalipse —, também
poderão ser manipuladas conforme a estratégia da política de informação,
ou de contra-informação, dos lados envolvidos e ali retratados, o que
seria de todo lamentável.
O
presente estudo propõe uma análise objetiva quanto aos fatos ocorridos no
dia 11 de setembro de 2001, situando-os no contexto geral do Apocalipse,
para que se possa ter uma idéia do que ainda está por vir, conforme o anúncio
profético do apóstolo João. Para isso, nos despreocupamos em tornar agradável
ou simpático para esta ou aquela parte do conflito o que aqui será
exposto, até porque, no nosso entendimento, os profundos equívocos de
ambas as partes é que produziram tudo o que de desagradável ultimamente
vem ocorrendo no nosso mundo. São as eternas paixões humanas escudadas nas
posturas comuns ao imperialismo econômico e político como também no
fanatismo religioso e político, ambas as situações criando verdadeiros
monstros — as feras apocalípticas – que devoram tudo a sua volta. O
primeiro, concentrando riqueza e gerando miséria; o segundo, semeando
terror.
Somos
daqueles que pensam que nada justifica uma ofensa, um "arranhão"
sequer, quanto mais atentar contra a vida de alguém, sob nenhum tipo de
pretexto, seja este de ordem religiosa ou política. Afinal, se pretendemos
construir um mundo pacífico, como defender o uso da violência sob qualquer
ótica que se tente justificar? A violência é subproduto da ignorância
quanto aos aspectos espirituais que regem a vida na Terra e, o repetimos, não
a aceitamos sob nenhuma ótica de argumentação. Assim, a nada estamos
alinhados e somente buscamos o esclarecimento espiritual.
Isto posto, pedimos desculpas caso as interpretações aqui ofertadas venham a ferir suscetibilidades de alguns irmãos ou irmãs da família planetária, que estejam vinculados a algum dos lados do conflito, o que não é o nosso caso. Por quem somos, procuramos amar a todos os seres que vivem na Terra, indistintamente, pois enxergamos uma só família planetária vivendo neste mundo. E dia virá em que esta compressão será patrimônio moral e espiritual de todos, independente da singular diversidade que marca a vida terrena em todos os seus campos, diversidade esta que deverá sempre existir, pois talvez seja o que nos diferencie diante do cosmos. Existindo a consciência maior da cidadania planetária a diversidade se preservará como um dos aspectos mais belos do nosso planeta azul.
Portanto,
abordaremos o tema pretendido, primeiro analisando a situação psicológica
do apóstolo-evangelista João diante das circunstâncias de sua vida, em
especial quando da confecção das duas obras a eles referidas: o seu
evangelho e o livro do Apocalipse.
I.
A psicologia do apóstolo João Evangelista e o Apocalipse.
Jesus,
quando de suas aparições no estado de ressuscitado, sempre portou-se com a
costumeira simplicidade que o caracterizara em vida. Chegou mesmo a comer e
beber “como se fora um deles”, sorrindo com ternura ante a incompreensão
dos que escolhera para terem a graça de percebê-lo.
Vejamos
como a sua penúltima aparição foi descrita pelo próprio apóstolo, no
seu evangelho.
“...tornou
Jesus a manifestar-se aos seus discípulos junto ao lago de Tiberíades.
Manifestou-se deste modo: Estavam juntos Simão Pedro, Tomé (chamado Dídimo),
Natanael, os filhos de Zebedeu e outros dois dos seus discípulos.
Disse-lhes Simão Pedro: “Vou pescar.” Responderam-lhe eles: “Também
nós vamos contigo.” Partiram e entraram na barca. Naquela noite, porém,
nada apanharam. Chegada a manhã, Jesus estava na praia. Todavia os discípulos
não o reconheceram. Perguntou-lhes Jesus: “Amigos, não tendes acaso
alguma coisa para comer?” “Não”, responderam-lhe. Disse-lhes ele:
“Lançai a rede ao lado direito da barca e achareis.” Lançaram-na, e já
não podiam arrastá-la por causa da grande quantidade de peixes. Então
aquele discípulo (João - grifo do
autor), que Jesus amava, disse a Pedro: “É o Senhor!” Quando Simão
Pedro ouviu dizer que era o Senhor, cingiu-se com a túnica (porque estava
nu) e lançou-se às águas. Os outros discípulos vieram na barca,
arrastando a rede dos peixes (pois não estavam longe da terra, senão cerca
de duzentos côvados). Ao saltarem em terra, viram umas brasas preparadas e
um peixe em cima delas, e pão. Disse-lhes Jesus: “Trazei aqui alguns dos
peixes que agora apanhastes.” Subiu Simão Pedro e puxou a rede para a
terra, cheia de cento e cinqüenta e três peixes grandes. Apesar de serem
tantos, a rede não se rompeu. Disse-lhes Jesus: “Vinde, comei.” Nenhum
dos discípulos ousou perguntar-lhe “Quem és tu?”, pois bem sabiam que
era o Senhor. Jesus aproximou-se, tomou o pão, e lhe deu, e do mesmo modo o
peixe. Era esta já terceira vez que Jesus se manifestava aos seus discípulos,
depois de ter ressuscitado.”
“Tendo
eles comido, Jesus perguntou a Simão Pedro: “Simão, filho de João,
amas-me mais do que estes?” Respondeu ele: “Sim, Senhor, tu sabes que te
amo.” Disse-lhe Jesus: “Apascenta os meus cordeiros.” Perguntou-lhe
outra vez: “Simão, filho de João, amas-me?” Respondeu-lhe: “Sim,
Senhor, tu sabes que te amo.” Disse-lhe Jesus: “Apascenta os meus
cordeiros.” Perguntou-lhe pela terceira vez: “Simão, filho de João,
amas-me?” Pedro entristeceu-se porque lhe perguntou pela terceira vez:
“Amas-me?”, e respondeu-lhe: “Senhor, sabes tudo, tu sabes que te
amo.” Disse-lhe Jesus: “Apascenta as minhas ovelhas. Em verdade, em
verdade te digo: quando eras mais moço, cingias-te e andavas aonde querias.
Mas, quando fores velho, estenderás as tuas mãos, e outro te cingirá e te
levará para onde não queres. Por estas palavras, ele indicava o gênero de
morte com que havia de glorificar a Deus.”
“E
depois de assim ter falado, acrescentou: “Segue-me!” Voltando-se Pedro,
viu que o seguia aquele discípulo que Jesus amava (João)
(aquele que estivera deitado
reclinado sobre o seu peito durante a ceia, e lhe perguntara: “Senhor,
quem é que te há de trair?” Vendo-o, Pedro perguntou a Jesus: “Senhor,
e este? Que será dele?”
Respondeu-lhe Jesus: “Que te importa se eu quero que ele fique até que eu
venha? Segue-me tu.” Correu por isso o boato entre os irmãos de que
aquele discípulo (o próprio João
que escreveu este evangelho) não
morreria. Mas Jesus não lhe disse: “Não morrerá, mas: Que
te importa se quero que ele fique assim até que eu venha?” (Jo
21, 1-23).
Após
este fato, o Mestre orientou-os a seguir para Betânia onde ascendeu aos céus,
conforme descrito no evangelho de Lucas.
“Depois
os levou para Betânia e, levantando as mãos, os abençoou. Enquanto os
abençoava, separou-se deles e foi arrebatado ao céu. Depois de o terem
adorado, voltaram para Jerusalém com grande júbilo. E permaneceram no
templo, louvando e bendizendo a Deus.” (Lc 24, 50-53).
Assim,
no dia de sua ascensão — última aparição que fez aos seus —
apresentou-se de forma radiante e, com um sorriso na face, como a
significar toda a esperança que depositava no futuro da família terrestre.
Por
fim, Ele subiu aos céus junto com seus anjos para preparar o porvir.
Fez
cumprir em si mesmo todas as profecias do Antigo Testamento a Ele referidas.
“Depois lhes disse: “Isto é o
que vos dizia quando ainda estava convosco, era necessário que se cumprisse
tudo o que de mim está escrito na Lei de Moisés, nos Profetas, e nos
Salmos.”
Profetizou,
de sua parte, afirmando que voltaria para abraçar a todos. Se cuidou com
tanto zelo das profecias antigas, se cumpriu a estranha promessa da
ressurreição, o que não fará para que se cumpram as referentes ao seu próprio
retorno?
Outra
questão que precisa ser entendida é a dificuldade que João, o apóstolo-evangelista,
tinha de referir-se a si mesmo no seu próprio evangelho. Preocupado em se
posicionar como narrador privilegiado dos fatos — por ter participado
diretamente — e, ao mesmo tempo, tentar ser o mais fiel possível às
ocorrências e às palavras do Mestre, João foi o único dos evangelistas
que se preocupou em apresentar Jesus como sendo uma personalidade cósmica
em missão na Terra. Ressalta a sua divindade e apresenta-o como o Verbo de
Deus.
“No
princípio era o Verbo, e o Verbo estava junto de Deus e o Verbo era Deus.
Ele estava no princípio junto de Deus.”
“Tudo
foi feito por ele, e sem ele nada foi feito. Nele havia vida e a vida era a
luz dos homens. A luz resplandece nas trevas e as trevas não a
compreenderam.” (Jo 1,
1-5).
“O
Verbo era a verdadeira Luz que, vindo ao mundo, ilumina todo homem. Estava
no mundo e o mundo foi feito por ele, e o mundo não o conheceu. Veio para o
que era seu, mas os seus não o receberam.” (Jo 1, 9-11).
“E
o Verbo se fez carne e habitou entre nós, e vimos sua glória, a glória
que um Filho único recebe do seu Pai, cheio de graça e de verdade.”
(Jo 1, 14).
Os
demais evangelistas se preocuparam, cada um deles, com assuntos ou aspectos
específicos da vida e obra de Jesus.
Mateus,
por volta do ano 60, preocupou-se em escrever para os leitores judeus,
procurando demonstrar que Jesus era exatamente aquele que fora predito pelos
profetas do Antigo Testamento, mas que, infelizmente, não havia sido
reconhecido pelo próprio povo que lhe servira de berço terreno. Não é
sem motivo que o seu texto se
caracteriza pela abundância de citações do Antigo Testamento.
Marcos
reúne em seu evangelho, também escrito por volta do ano 60, as principais
pregações do apóstolo Pedro, ressaltando, para os pagãos, os milagres e
as obras realizadas por Jesus.
Lucas,
de origem Síria, além de helenizado — os demais evangelistas eram judeus
— escreveu seu evangelho servindo-se dos de Mateus e de Marcos e, apesar
de não ter convivido pessoalmente com Jesus, conversou com muitas pessoas
que o fizeram, entre as quais Maria, a mãe de Jesus. Escrevendo também
para os pagãos, descreve principalmente a bondade e a misericórdia
ímpares do Mestre.
João,
ao contrário dos demais, escreveu seu evangelho quase trinta anos depois
dos primeiros. Muitos fatos que foram determinantes para o que João viria a
fazer no futuro ocorreram entre a confecção dos escritos de Mateus,
Marcos, Lucas e o de João.
Contudo,
antes mesmo de decidir confeccionar o seu próprio evangelho, ele teve que
percorrer caminhos tortuosos, carregando sobre os seus ombros o peso de ser
o único remanescente dos apóstolos ainda vivo e fugindo continuamente da
perseguição romana. Essa etapa de sua vida começou por volta do ano 70,
quando todos os outros apóstolos, como também Paulo, já haviam morrido ou
saído das terras da Palestina e mesmo de Roma. João, pelo simples fato de
estar vivo, tinha a desconfortável responsabilidade de servir como único
foco para esclarecer e tirar dúvidas para as diversas agremiações cristãs
então existentes. A todo instante era procurado por diversos grupos que lhe
apresentavam problemas relativos ao entendimento e ao significado das
palavras de Jesus, como também em relação a algumas passagens da sua
vida.
O
que mais perguntavam a João era a respeito da tão propalada e prometida
volta de Jesus. Afinal, Mateus, Marcos e Lucas haviam ressaltado nos seus
evangelhos, de forma abundante, as próprias profecias de Jesus a respeito
de seu retorno. Vejamos algumas das principais passagens evangélicas a esse
respeito.
“Ao
sair do templo, os discípulos aproximaram-se de Jesus e fizeram-no apreciar
as construções. Jesus, porém, respondeu-lhes: “Vede a todos estes edifícios?
Em verdade vos declaro: Não ficará aqui pedra sobre pedra; tudo será
destruído.” (Mat 24, 1-2). Jesus
referia-se à ruína de Jerusalém que ocorreria por volta do ano 70.
“Indo
ele assentar-se no monte das Oliveiras, achegaram-se os discípulos e,
estando a sós com ele, perguntaram-lhe: “Quando acontecerá isto? E qual
será o sinal de tua volta e do fim do mundo?” Respondeu-lhes Jesus:
“Cuidai que ninguém vos seduza. Muitos virão em meu nome dizendo: Sou eu
o Cristo. E seduzirão a muitos. Ouvireis falar de guerras e de rumores de
guerra. Atenção: que isso não vos perturbe, porque é preciso que isso
aconteça. Mas ainda não será o fim... Este Evangelho do reino será
pregado pelo mundo inteiro para servir de testemunho a todas as nações, e
então chegará o fim.” (Mat
24, 3-14).
“
Então se alguém vos disser: Eis
aqui está o Cristo! Ou: Ei-lo acolá! Não creiais, porque se levantarão
falsos cristos , e falsos profetas que farão milagres a ponto de seduzir,
se isto fosse possível, até mesmo os escolhidos... Porque, como o relâmpago
parte do oriente, e ilumina o Ocidente, assim será a volta do Filho do
homem. Onde houver um cadáver, aí se ajuntarão os abutres.” (Mat
24, 23-28). Assim expressava-se Jesus para simbolizar a convergência da
atenção mundial em torno de sua personalidade celestial, quando de sua
volta que será percebida por todos, não necessitando para tanto que ninguém
se desloque ou assuma este ou aquele credo para tornar-se um dos eleitos.
Como pastor cósmico que é, voltará para abraçar a todas as suas ovelhas
do aprisco terrestre — “Tenho
ainda outras ovelhas que não são deste aprisco.” (Jo 10, 16), já
que “Na casa de meu Pai há muitas
moradas.” (Jo, 14, 2) — e não somente aquelas inseridas em alguma
religião ou em movimento de qualquer ordem, afirmam os mentores
espirituais.
“Logo
após estes dias de tribulação, o sol escurecerá, a lua não terá
claridade, cairão do céu as estrelas e as potências dos céus serão
abaladas. Então, aparecerá no céu o sinal do Filho do homem. Todas as
tribos da terra baterão no peito e
verão o Filho do homem vir sobre as nuvens do céu cercado de glória e de
majestade. Ele enviará seus anjos com estridentes trombetas, e juntarão
seus escolhidos dos quatro ventos, duma extremidade do céu à outra.
Compreendei isto pela comparação da figueira: quando seus ramos estão
tenros e crescem as folhas, pressentis que o verão está próximo. Do mesmo
modo, quando virdes tudo isto, sabei que o Filho do homem está próximo, à
porta. Em verdade vos declaro: Não passará esta geração antes que tudo
isto aconteça. O céu e aterra passarão, mas as minhas palavras não
passarão. Quanto àquele dia e àquela hora, ninguém o sabe, nem mesmo os
anjos do céu, mas somente o pai.” (Mat 24, 29-36). Jesus referia-se
claramente a um tempo futuro mas afirmava que tudo podia passar, menos o
cumprimento da sua promessa. Muitos, entretanto, achavam que Ele retornaria
ainda naquela época.
Mateus,
explorando o tema da volta de Jesus, no capítulo 24, nos versículos 37 até
o 51, continua a desenvolver simbolicamente a maneira pela qual se podia
vislumbrar quais os sinais da tão esperada volta. Também em todos os versículos
do capítulo 25 do seu evangelho aborda de forma insistente o tema.
Marcos,
no capítulo 13, e Lucas, no capítulo 21, desenvolvem as suas descrições
quanto à Volta do Filho do Homem, que aqui não iremos repetir por pouco
acrescentar ao que já foi expresso por Mateus.
Devemos
somente ressaltar que, naqueles dias, após a confecção dos três
primeiros evangelhos, a questão da volta do Cristo passou a ser discutida
por todos os que tinham alguma relação, fosse com o cristianismo nascente
ou com as eternas querelas existentes entre os judeus que não aceitavam
Jesus, com o poder romano que absolutamente não se preocupava com os fatos
ocorridos e com os exaltados cristãos que viam na volta de Jesus uma espécie
de vitória de seus argumentos e opiniões.
Se
Ele já havia ressuscitado, como prometera, voltar não seria maior
dificuldade, pensavam alguns. O problema é que ainda vinculavam, de maneira
equivocada, o seu retorno com a eterna esperança do povo de Israel em
assumir o seu real lugar entre as nações da Terra, conforme esperavam, já
que não suportavam a dominação romana.
Assim,
por volta do ano 70 d.C, o general romano Tito invadiu Jerusalém,
destruindo o templo sagrado dos judeus e tudo o mais que encontrou pela
frente. Foi uma nova diáspora para aquele povo já tão sofrido. Muitos dos
cristãos-judeus esperavam a volta prometida de Jesus ainda para aqueles
tempos.
Por
essa época, de todos os apóstolos, o único que se encontrava na Palestina
— além do fato de que quase todos os que haviam convivido com Jesus já
haviam morrido — era João. Como todos os outros, teve que procurar uma
nova região para viver, resolvendo ficar ora em Antioquia, ora em Éfeso e
em outras cidades espalhadas pela Ásia Menor, fixando-se por fim, na Grécia,
por volta do ano 95, devido às brutais perseguições que o imperador
Domiciano impusera aos cristãos.
João
foi escrevendo o seu evangelho enquanto se deslocava por essas cidades.
Recordava-se constantemente do episódio da transfiguração. Mateus (17,
1-13), Marcos (9, 2-13) e Lucas (9, 28-36) haviam se referido ao fato nos
seus evangelhos. Ele, entretanto, não o faria. Havia sido um dos
personagens, junto com Pedro e Tiago, daquele dia inesquecível. Mas, ainda
assim, não iria repetir o que já estava dito. Espremido pela desesperada
pressão do povo judeu quanto ao retorno de Jesus e, sem saber o que dizer,
pois nem ele mesmo sabia quando tal fato seria, tornou-se o evangelista que
menos se referiu à promessa de sua volta — aspecto do qual se
arrependeria mais tarde. Naquela época, as expectativas quanto à Volta do
Mestre eram fato comum nos comentários dos cristãos, e mesmo dos judeus não-cristãos,
fosse a título de crença ou mesmo de pilhéria.
João
recordava a todo momento da última vez em que o Mestre lhes aparecera como
ressuscitado, em especial, das suas palavras, que diziam da sua vontade de
que João ficasse até que ele
viesse. Perguntava-se o que significava “ficar”.
Ele estaria vivo quando Jesus retornasse? Se assim fosse, o que deveria ele
fazer? Mas, e a nação judaica,
novamente espalhada pela Terra? E ele, um simples exilado que fugira sob a
proteção dos demais, quando o exército romano destruiu Jerusalém?
Vivendo em terras estrangeiras, como pregar a volta de Jesus, se nem mesmo
havia mais a terra prometida dos judeus para ser o centro de todo o
processo? Jesus voltaria como? Como havia aparecido logo após a sua
crucificação? Mas Ele lhes dissera que haveria de vir sobre as nuvens do céu
e que a sua volta seria percebida por todos; como seria tal coisa possível?
Seu
cérebro terreno, com o conhecimento que adquirira naquela existência, não
lhe permitia ir mais além nas suas angustiadas reflexões. O próprio nível
de conhecimento da época, o fatalismo cultural dos judeus, as frustradas
expectativas da vinda de um messias vencedor — e não de um que havia sido
derrotado e crucificado —, limitavam qualquer tentativa mais produtiva no
campo do entendimento. O recado cósmico de Jesus (composto do anúncio de
um Pai Celestial amantíssimo, da lei seguida por todos os seres e espíritos
evoluídos do “amai-vos uns aos outros”, das muitas moradas espalhadas
pelo cosmos, de que Ele, Jesus, era o elo entre os que viviam na Terra e os
habitantes dessas outras moradas e de que Ele retornaria quando os tempos de
renovação fossem chegados) tornou-se inapelavelmente refém do limitado
conhecimento dos evangelistas. Não podia mesmo ser diferente.
E
Jesus não chegava. O tempo, inclemente com as crenças, sejam elas quais
forem, passava célere. João, que havia presenciado pessoalmente — e não
por descrições de outros sempre passíveis de distorções de toda ordem
— o poder pessoal do seu amado rabi, sabia que Ele não poderia ter se
enganado. Se tudo que Ele fez, o fizera de tal forma revestido de uma
autoridade jamais vista por alguém, se tudo que Ele dissera acontecera, até
mesmo quanto à destruição de Jerusalém, por que não cumpriria
exatamente a que mais ressaltara nas suas pregações, durante os últimos
meses de sua vida na Terra?
Concluiu,
finalmente, o seu evangelho, preocupado em escrever, não para os judeus ou
para os pagãos, como o fizeram Mateus, Marcos e Lucas; escrevera, sim, para
os cristãos, ressaltando a divindade de Jesus. Divindade que nem mesmo ele
compreendia. Por não compreendê-la, resolveu, ao contrário dos outros
evangelistas, não expressar o que já havia sido ressaltado: a promessa de
retorno do Mestre. Essa decisão marcou-lhe a inquietude como companheira
constante nos anos posteriores à confecção do seu evangelho, porque
depois perceberia que havia agido daquela forma por simples conveniência
pessoal, já que, se continuasse afirmando que Jesus retornaria, teria que
fornecer maiores explicações sobre a tão esperada volta. Eram-lhes
constrangedoras tanto uma quanto outra alternativa. Arrependera-se de assim
ter feito. Ele, que vivera ao lado de Jesus, sabia que as conveniências
pessoais eram de tom menor ante a empreitada com buscas à redenção da
humanidade.
Cercado
por muitos discípulos, dentre eles um que lhe era muito especial, também
chamado João e que rotineiramente escrevia os seus apontamentos, seguia o
curso de sua vida agora já radicado definitivamente na ilha grega de Patmos,
de onde distribuía as suas epístolas para os demais centros cristãos que
haviam sido semeados pelo trabalho incessante de Paulo, de Pedro e de outros
trabalhadores da seara do Mestre.
Constantemente
aturdido pelas lembranças dos acontecimentos, sentia-se algo culpado pela
opção que fizera. Já com idade avançada, percebia claramente que não
era para o seu tempo o tão prometido retorno. Jesus dissera a eles todos,
em diversas oportunidades, que a sua mensagem haveria de espalhar-se por
toda a Terra. Depois disso, Ele retornaria. De forma equivocada, entretanto,
pensaram tratar-se, primeiro, da tão esperada supremacia da nação judaica
sobre as demais e, assim, os ensinamentos do Mestre seriam finalmente
conhecidos por todos. João refletia, naqueles instantes, que se nem mais nação
judaica existia, de que forma ele deveria pensar sobre o retorno de Jesus? Não
o sabia. Percebera apenas que não era no tempo de sua vida que o evento
ocorreria. Isso, ele finalmente percebera. Arrependia-se, entretanto, de ter
sido o único, entre os que escreveram sobre Jesus, a não expressar
claramente a promessa da sua volta. Ele, logo ele que, para todos, era a última
e única referência quanto aos fatos vividos por Jesus e das suas próprias
promessas.
Eis
que o seu Mestre, de outros rincões existenciais, resolve convocar o espírito
encarnado de seu discípulo amado para um encontro esclarecedor quanto ao
porvir. Atendendo a suas preces desesperadas, na solidão de sua
responsabilidade, como sendo o último a ter convivido com Ele, resolve
Jesus trazê-lo à sua presença, como também diante de sua assessoria cósmica,
para conversas e esclarecimentos que ficaram expressos para a posteridade
nas páginas do livro Apocalipse.
Muitos
pensam não ter sido o apóstolo-evangelista João o autor do livro. De
fato, ele foi o autor intelectual da obra, já que foi ele mesmo que, em
estado desdobrado de sua consciência espiritual, presenciou os fatos
descritos no livro. Entretanto, seu discípulo, também chamado João,
conforme notícias dos mentores espirituais, foi quem tomou nota do que lhe
era descrito pelo apóstolo.
Foram
momentos de profunda alegria para João. Se bem pudéssemos descrever os
fatos que nos são mostrados pela Espiritualidade, tentaríamos comparar o
que houve com João ao que normalmente ocorre quando, em certo “cochilo da
consciência”, de alguns poucos minutos, cabem histórias vividas em pleno
sonho cuja sensação psicológica corresponde a horas. É como se em um
simples sono de 15 minutos coubesse uma história que levaria horas para
ocorrer. Acontece que o tempo existencial varia conforme os padrões vibratórios
do meio em que se está inserido. Assim, João passou “horas em estado de
desdobramento” onde recolheu as informações que lhe foram transmitidas
pelo Mestre e pelos seus assessores que vivem outros mundos — normalmente
chamados de anjos.
Convivendo
com eles, durante o desdobramento de sua consciência espiritual — também
chamada de arrebatamento em êxtase pelo próprio apóstolo — percebera
mais e mais seres com vestes resplandecentes como aqueles que vira no
momento da transfiguração. Notara que, inclusive, as duas entidades que se
projetaram para parlamentar com Jesus quando este se transfigurou — ou
seja, elevou as suas vibrações pessoais para poder sintonizar-se com os
dois seres que desceram “da nuvem cuja sombra os cobria” — estavam
também ali presentes.
Emocionou-se
quando lhe foi dado perceber que o seu antigo mestre João Batista, de quem
fora discípulo antes de começar a seguir Jesus a pedido daquele, estava
também ali, só que sob uma outra roupagem fisionômica, já que ele havia
sido um dos dois que se encontraram com Jesus. Perguntava-se como podia ser
tal fato, se ele, João, que estava acompanhando Jesus no instante em que
ocorreu a transfiguração, percebera que Pedro havia se referido aos dois
seres ali presentes como sendo Elias e Moisés.
Lembrou-se,
inevitavelmente — no estado em que se encontrava
— que o próprio Mestre lhes dissera que Elias já “tinha
vindo”, na nova personificação terrena do seu espírito, na pessoa de João
Batista.
“...E,
quando desciam (após o momento da transfiguração),
Jesus lhes fez esta proibição: Não conteis a ninguém o que vistes até
que o Filho do homem ressuscite dos mortos. Em seguida, os discípulos o
interrogaram: “Por que dizem os escribas que Elias deve voltar
primeiro?” Jesus respondeu-lhes: “Elias, de fato, deve voltar e
restabelecer todas coisas. Mas eu vos digo que Elias já veio, mas não o
conheceram; antes, fizeram com ele quanto quiseram. Do mesmo modo farão
sofrer o Filho do homem.” Os discípulos compreenderam, então, que ele
lhes falava de João Batista.” (Mat 17, 9-13).
O
espírito de João estava vivendo um momento ímpar, com todos aqueles seres
ali presentes. Vira o que até hoje muitos iniciados, mestres, médiuns,
sacerdotes, pesquisadores e cientistas desejariam ver: seres que vivem em
outros mundos que não o terreno; e aprendera que estes seres podem
eventualmente nascer na Terra e, após a morte dos seus corpos transitórios,
retornar para os seus mundos de origem; o próprio Mestre Jesus, na forma da
sua personificação cósmica; máquinas e bases de civilizações outras
que não a terrena, estacionadas próximas à Terra, exatamente onde estava
ocorrendo aquele encontro posteriormente descrito no Apocalipse; enfim,
aspectos de um contexto cósmico naquela época impossível de ser percebido
através da ótica terrena.
Ao
retornar à sua consciência terrena — produto do seu cérebro físico,
como de sorte ocorre com todos nós que estamos submetidos às leis das
reencarnações —, quando despertou novamente para os fatos da Terra, a
sua mente espiritual começou a jorrar para o seu cérebro físico as
lembranças, as recordações, as frases e as sensações indescritíveis do
encontro ocorrido. João relatou da forma que lhe foi possível, acerca do
conteúdo dos fatos mas lhe era
impossível compreender o significado do que presenciara.
Socorreram-lhe
os discípulos mais próximos, já que João possuía idade bastante avançada.
Começaram a tomar nota, coordenados pelo discípulo também chamado de João,
cuja composição final compôs as páginas do Apocalipse. Se antes, por dúvidas
de todas as matizes conjugadas às inevitáveis conveniências de quem vive
na Terra, preferira eximir-se de expressar a promessa da volta futura do
Cristo, agora nada mais lhe retinha a renovada intenção antes sufocada
pelas circunstâncias.
Expressou,
portanto, tudo o que lhe veio à mente como sendo recordação do encontro.
Os mentores celestes ajudavam no que podiam, para que a fixação das
lembranças vividas ocorressem na sua memória, conforme as circunstâncias
o permitissem, apesar do pouco ou nenhum entendimento do seu cérebro a
respeito das ocorrências futuras que lhe foram reveladas.
Enquanto
alguns param, esperando dias melhores, outros continuam a preparar o porvir.
João, arrependido pelas posturas anteriores, resolve trabalhar até os últimos
instantes de sua vida pela propagação da graça maior que seria, no
futuro, o retorno de Jesus. Compreendera que, quando lhe foi dito pelo
Mestre que ele deveria ficar até que Ele viesse, havia recebido um recado
cujo significado era, na realidade: ficar reencarnando na Terra, ajudando ao
progresso planetário, até que a promessa da vinda do Mestre fosse
cumprida. Vislumbrou vidas futuras que, por prudência, achou melhor a elas
não se referir para não complicar o que por si só já era tarefa
complexa: compor, de forma ordenada, as mensagens do Apocalipse.
Quando
do seu desdobramento, vira todos os outros apóstolos — à exceção de
Judas — ao lado do Cordeiro assentado em seu trono coberto de glória,
conforme suas próprias palavras transcritas pelo seu discípulo escrevente
nas páginas do livro por todos conhecidos, porém incompreendido até os
dias atuais.
Recordara-se
da razão pela qual, sempre de maneira suave, Jesus o prevenira de que, um
dia, ele haveria de ser o único dos apóstolos a estar vivo na Terra,
trabalhando pela edificação do “reino de amor do Pai Celestial”.
Mesmo
com os receios inerentes à condição humana — as perseguições
promovidas por Domiciano estavam à solta e qualquer intriga poderia ser
motivo de escândalo; milhares de cristãos estavam sendo queimados,
crucificados, decapitados e lançados às feras nos circos romanos — João
encaminhou às Igrejas que já existiam naquele tempo o recado amoroso
quanto à volta de Jesus que deveria ocorrer em tempos futuros.
Absolutamente ninguém o levou muito a sério. O que de mais importante
existia em termos de recado do Mais Alto para os que viviam na Terra não
fora jamais percebido como tal, da mesma forma que não o foi até mesmo nos
dias atuais.
Se
antes, quando da confecção do seu evangelho, faltaram-lhe forças para
insistir na única e mais ressaltada promessa de Jesus ainda por ser
cumprida, agora, nas páginas do Apocalipse — livro profético que mostra
a luta entre a luz e as trevas e o fluxo dos acontecimentos que culminam com
a tão prometida volta de Jesus —, João derramava toda a vivência e
certeza do que lhe fora revelado em espírito, quanto à vinda futura do
Mestre. Com as revelações que recebera ao fim de sua vida terrena,
compreendera finalmente todos os aspectos antes não compreendidos das
muitas passagens da vida de Jesus, que tivera nele testemunha privilegiada
dos fatos ocorridos. Sabia que o seu amado rabi haveria de retornar para
redimir toda a humanidade e sabia também que, ao contrário dos demais apóstolos
que saíram do contexto terreno após as dolorosas mortes que tiveram e que,
no futuro, quando do cumprimento da última promessa, voltarão ao lado de
Jesus, ele ficaria trabalhando na Terra, em vidas futuras, até que os
tempos fossem chegados. E eis que os tempos já são chegados.
“Ei-lo
que vem com as nuvens. Todos os olhos o verão, mesmo aqueles que O
traspassaram.” (Apocalipse, 7).
“Eis
que venho em breve! Felizes aqueles que põem em prática as palavras da
profecia deste livro... O injusto faça ainda injustiças, o impuro pratique
impurezas. Mas o justo faça a justiça e o santo santifique-se ainda mais.
Eis que venho em breve, e a minha recompensa está comigo, para dar a cada
um conforme as suas obras.” (Apocalipse 22, 7-12).
O
recado cósmico de Jesus, quanto à sua volta, estava renovado. Somente o
porvir talvez lhe pudesse dar guarida no campo do entendimento, até porque
o Consolador haveria de vir esclarecer todas as coisas antes do seu retorno
no estado glorioso (cósmico), papel este assumido corretamente pelo
Espiritismo.
Tempos
difíceis foram aqueles vividos pelo apóstolo João, nos últimos dias de
sua vida. Procurado a todo momento por muito os
cristãos, se esquivava o quanto podia, em se comprometer com ensinamentos
que não podia provar serem verdadeiros. No entanto, ao ter a inabalável
certeza da volta do Mestre, passou a explicá-la, conforme permitiam as
circunstâncias do entendimento à época dos fatos.
Segundo
a opinião de alguns estudiosos, Daniel, entre os profetas do Antigo
Testamento, foi quem recebeu a maior revelação profética, tendo recebido
João, o apóstolo amado, a maior do Novo Testamento.